terça-feira, 26 de junho de 2007

A Descoberta das Índias (ou Quando nossas caravelas se cruzaram no Cabo da Boa Esperança)

Como na época das grandes navegações
Ambos se lançaram ao mar –
Mar de divagações, mar de experiências,
Mar de sensações, mar de efervescências.
Eram navegantes ou piratas?
Amantes ou meros entusiastas?
Bem, bem, bem:
Só a História dirá, lhes dirá.

Estavam ambos do outro lado do Atlântico e,
Quando se encontraram,
Algo como o Tratado de Tordesilhas:
Aqui termina o meu corpo, aqui começa o seu.
Essa é você, este aqui sou eu.
O primeiro beijo veio volátil,
Surpreendido pela realidade além-mar, além-céu,
De onde veio esse beijo? Veio tão rápido!
Nem falemos de conquista;
Era mais uma parceria, um desbravar conjunto
E curioso por selvas e veredas e gelos e praias
E grutas e pequenos montes e grandes montanhas.

Havia um acordo tácito – digno das Nações Unidas –
De fazer a paz, de fazer o amor,
Mesmo que a guerra fosse possibilidade escondida
E estivessem tão solícitas as tropas de um
Em relação às tropas do outro:
Isso, isso, isso. Faz assim, por aqui.
Siga-me. Como é bom!

Costas, planícies.
Peitos, quase planaltos.
Pescoços, abismos, oh, abismos.
As fronteiras começaram a desaparecer,
Cataclismo!
Suores, salivas, minhas mãos,
Seus pés, nossas pernas,
Sou agora sua extensão,
Você é minha cisterna.
Quantas estrelas surgiram naquela noite
(Era noite? Era dia? Estrelas havia.)
Avante, cidadãos!
Nenhum ferimento – apenas cicatrizes
Misturadas: testa, pescoço, pulso, ventre,
Todas, nenhuma. Avante!
Sorrisos, suspiros, delírios, sono.
Só uma vez mais, de novo.
O lençol azul brincava de oceano,
Calmíssimo, juntando os amantes.

Mas eles eram também navegantes.
E, como em toda a história das navegações,
Ou se cria um país
Ou se transforma um continente
Ou se circula circunda o planeta
Nossos esfuziantes piratas
Crêem que descobriram um novo mundo.
Um mundo sem fronteiras,
Fora do mapa e das respostas.

Porém, o que fazer?
Propostas?

Terra firme ou horizonte?
Palmeiras, casas de telhado azul,
Planos retilíneos, vulcões inativos?
Lar, doce lar, rotina?
Ou seguir adiante, onde o mar acaba,
(Se é que acaba)
Onde o céu começa,
(Se é que começa)
Onde ambos se aglutinam?

Separam-se, vestem-se, despedem-se do lençol azul.
Esquecem o passado amante-entusiasta,
Novomundista e iconoclasta.
E deixam para os incautos alunos secundaristas
A inóspita tarefa de tentar entender –
bem antes da hora, talvez –
Os bastidores do heróico período
Das grandes navegações.

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