domingo, 22 de julho de 2012

deixa


Deixei a chave do lado de fora da porta. E ele entrou. Deixei minhas armadilhas ao lado da cama, e ali ele logo se deitou. Deixei meu coração sem defesa por um instante – e ele o arrebatou.

Aqui estou, tarde longa de domingo distraído, quase sem vento, quase sem solidão, à espera de uma sensação qualquer que possa ordenar a multidão de vontadezinhas e pensamentozinhos e fantasiazinhas e pedacinhos tortos de mim mesma espalhados nessa bagunça sem-fim. O telefone não vai tocar, o e-mail não vai chegar. Nem virão a carta, o verso, a foto, o postal. Me escapam a inspiração e o apetite; mas não há fome nem dor, apenas um leve calor de carne que existe, de sangue que corre, de desejo que acende, de mulher que ama. Falta ele, e ele faz falta.

As horas se arrastam para fazer companhia à minha espera. Drummond repousa na mesa de cabeceira, repetindo: reserve-se toda para as bodas que ninguém sabe quando virão, se é que virão. Aperto os lábios abortando um quase-soluço, tropeço na saudade e sujo as paredes com certas canções lacrimosas. Ele faz falta.

Deixei um mapa especialmente feito para ele, mas ele não voltou.