domingo, 21 de abril de 2013

travessões


Não suma.
Não fuja.

Não se assuste.
E, então, naquela quase-madrugada fresca e ligeiramente embevecida, naquele momento em que certas coragens etílicas se faziam tão aparentes, nos despedimos.

Depois, o óbvio: nos assustamos com nós mesmos. Fugimos. Sumimos. Desaparecemos.

Sentimentos interditos brotaram, a princípio tímidos, gradativamente intransigentes. Fiquem tortos em seu canto, tem dito a razão. Tortos e inertes. Não nasçam, não cresçam, não se desenvolvam. Desafiem a lei da vida; abortem-se. Os afetos são surdos. Os afetos são irracionais. Petulantes, provocam todo o tempo a ordem estabelecida, reviram ralos e remos, riscam discos e desafinam os cânticos. Estão aí, sobreviventes, beligerantes, em franca travessia e invasão de fronteira. Por que não?

Somos duas mulheres, somos dois homens. A questão é que sempre coincidimos. Quando somos mulheres, o somos as duas. Quando somos homens, o somos os dois. Assim, nunca estamos uma mulher e um homem. Por isso, a impossibilidade. Mas vá dizer aos afetos, vá explicar-lhes como as coisas funcionam no mundo prático, pragmático e viável. Os afetos simplesmente encontraram uma brecha e soltaram-se.

A vontade era ficar apenas a seu lado, em silêncio. Receber um abraço seu. Ouvir, ouvir, falar, falar, tocar. A vontade era provar de novo esse sentimento de saciedade num peito tão insatisfeito.
Não suma.
Não fuja.

Estou muito assustada.