Ela era a mulher da saia rodada e florida, do sorriso no rosto, do belo buquê de gérberas cor de rosa nas mãos em pleno lusco-fusco. Era ela.
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domingo, 9 de maio de 2010
quinta-feira, 29 de abril de 2010
DEADLINE
Tlim, tlom.
Tic-tic-tic-tic-tic.
O nó na garganta não subia nem descia. Estava entalado, apertava o coração lá embaixo, agitava os pés descalços, que roçavam displicentes o tapete estampado. Os olhos embaçados de choros que não vinham porque não estavam prontos. Os joelhos, curiosos, espiando pela bainha da saia sua dona aflita.
Ele escreveu (e não foi para ela): a gente não pode ter tudo o que quer.
Citou Rolling Stones: You can’t get always what you want.
As horas passavam.
Ele lhe deu um beijo de despedida, ele perguntou no dia seguinte, quando ela telefonou do aeroporto: por que você não me avisou que só voava à tarde? Ele disse que queria vê-la antes da partida. Agora não quer mais?
O tempo passava.
Seu corpo, seu corpo parecia sempre o mesmo, porém mais flácido. Menos dela, mais coletivo.
Tic-tic-tic-tic.
O cansaço gradativo e miudinho das células é implacável.
Tic-tic-tic-tic-tic.
O nó na garganta não subia nem descia. Estava entalado, apertava o coração lá embaixo, agitava os pés descalços, que roçavam displicentes o tapete estampado. Os olhos embaçados de choros que não vinham porque não estavam prontos. Os joelhos, curiosos, espiando pela bainha da saia sua dona aflita.
Ele escreveu (e não foi para ela): a gente não pode ter tudo o que quer.
Citou Rolling Stones: You can’t get always what you want.
As horas passavam.
Ele lhe deu um beijo de despedida, ele perguntou no dia seguinte, quando ela telefonou do aeroporto: por que você não me avisou que só voava à tarde? Ele disse que queria vê-la antes da partida. Agora não quer mais?
O tempo passava.
Seu corpo, seu corpo parecia sempre o mesmo, porém mais flácido. Menos dela, mais coletivo.
Tic-tic-tic-tic.
O cansaço gradativo e miudinho das células é implacável.
Tic-tum. Morria uma. Tic-tam. Esmorecia outra.
Ele pediu “ele e ela”, ela provou os dois, mas ficou só com ele. Ele optou por elas. Ela e ela. E era da outra que falava: a gente não pode ter tudo o que quer. Ah, aquele abraço era de nada no fim das contas. Ou tinha sido aquele abraço bom naquele dia, naquele momento e ponto.
Tlim, tlom.
Ele furava poços mundo afora. Mundo conflituoso afora. Eles se encontraram, algo brilhou, mas nevava muito. Escorregadio. Havia outra, sabe. Estou tentando construir um relacionamento, ele disse. Entendo, suspirou ela.
O corpo. O abdômen. Gordura adiposa pura, nada de mais.
O corpo. As trompas, os ovários, o útero – todos contando os dias para a aposentadoria.
Ei, ele! E ele?
Os joelhos continuavam a observar sua dona, impassível em sua dignidade de mulher-fêmea-flor. Flor. Cheia de pólen, cheia de amor, cheia de medo, cheia disso, mas vazia daquilo. Ah.
O tempo, o calendário, a idade, a veracidade, a durabilidade, os genes, os óvulos.
Almoçaram. Ele disse: quando é hora de partir, eu me vou. Ele, um peregrino. Ele, um homem do mundo, dos tempos, dos ventos, das areias e dos desertos. Ele, tão parecido com ela. Mas ele não se despede, ele simplesmente vai. E foi.
Ele pediu “ele e ela”, ela provou os dois, mas ficou só com ele. Ele optou por elas. Ela e ela. E era da outra que falava: a gente não pode ter tudo o que quer. Ah, aquele abraço era de nada no fim das contas. Ou tinha sido aquele abraço bom naquele dia, naquele momento e ponto.
Tlim, tlom.
Ele furava poços mundo afora. Mundo conflituoso afora. Eles se encontraram, algo brilhou, mas nevava muito. Escorregadio. Havia outra, sabe. Estou tentando construir um relacionamento, ele disse. Entendo, suspirou ela.
O corpo. O abdômen. Gordura adiposa pura, nada de mais.
O corpo. As trompas, os ovários, o útero – todos contando os dias para a aposentadoria.
Ei, ele! E ele?
Os joelhos continuavam a observar sua dona, impassível em sua dignidade de mulher-fêmea-flor. Flor. Cheia de pólen, cheia de amor, cheia de medo, cheia disso, mas vazia daquilo. Ah.
O tempo, o calendário, a idade, a veracidade, a durabilidade, os genes, os óvulos.
Almoçaram. Ele disse: quando é hora de partir, eu me vou. Ele, um peregrino. Ele, um homem do mundo, dos tempos, dos ventos, das areias e dos desertos. Ele, tão parecido com ela. Mas ele não se despede, ele simplesmente vai. E foi.
Tsi-tsi-tsi
Ela?
Ela olha pela janela, ignora os pequenos alarmes, ela sonha com aquele abdômen repleto do amor de um encontro profundo e intenso. Ela sonha com. Ela ainda sonha com. Ela, um explosivo sem hora certa para se espalhar, semear.
Ela cheia de sementes. Com aquela flor no cabelo. Com aquele nó entalado não se sabe onde. Ela e seu sorriso escondido para ele, um ele, um deles.
sexta-feira, 25 de dezembro de 2009
quarta-feira, 7 de outubro de 2009
Ainda que esteja surda ou paralisada, meu útero me lembra de que sou mulher. Não mãe em potencial, alma feminina, mocinha inteligente ou bombocados afins. Não. Me lembra estridente: m-u-l-h-e-r. Às vezes me esqueço. E, nos momentos de assexuadice, ele chacoalha dolorido as dores e dolores cá de dentro: sai. Volta, mulher. Irrita-se com as férias forçadas. Manda embora veracruzes, dulces, evas e busca de volta mulhermariamulher. Meu útero desdenha das revistas femininas, dos aparelhos de ginástica e das dietas insossas. Ele gosta de sangue, de vermelho, de presença, de voracidade, de tenacidade, de entrega. Não se cegue, ele me diz, diz não, grita, porque meu útero não é discreto. Ignora as convenções e pede vestidos, saias e sandálias, pede homem. Meu útero afirma que não importa nada disso que me aborrece, porque no fundo é ele que reluz quando. E se. Como. Para. Meu útero é meu órgão revolucionário, liberta a alma, fala de amor aos domingos e delira nas noites de lua calma. Ainda que à revelia, quando cinza, explodo em rubro uterino, veemente e faceira. Mulher, mesmo em descrédito, mulher, surpreendida.
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