terça-feira, 18 de março de 2008

dia de minhoca

Via neve, embora estivesse apenas nublado. Via tempestades e alagamentos, embora a chuva teimasse em ser suave. Via caminhos compridos, faltando tanto tanto tanto para serem devidamente cumpridos que. Sempre era assim. Tudo muito comprido cumprido contínuo que. Faltava-lhe energia? Faltava-lhe disposição?


Que. Mas sempre continuava, ia adiante desbravava lava cava lavra crava larva cravo flor, estupor! Dor! Frescor! Os túneis longos túneis sempre terminavam em algo, um atalho, um orvalho, um abismo. Ou luz. Não que sempre tivesse de experimentar também o fim deles; muitas vezes, chegava ao final e pulava para outro caminho. Mas já tinha provado terminá-los, claro, inevitável e irrevogável necessidade. Não era fácil para sua natureza subterrânea e autista, acostumada ao chão e às cavidades de si mesma e voluntária e esporadicamente encerrada em sua vida invisível, encarar a luz, assim, de supetão. Por isso, às vezes ia de atalho, em muitas outras rolava no orvalho, quase sempre deixava-se cair no abismo até sentir-se pronta para a luminosidade. Pronta para a luz. A do mundo, a da vida, a dos outros, a sua mesma.


Que. Não era propriamente preguiça tal e qual, medo como o de todos, falta de confiança em si. Talvez fosse a inexorabilidade do impulso, uma certa entrega à hibernação imperativa, à etapa de esfarelamento de fênix, descenso, para depois surgir.


Então estava num dia desses, terra úmida e porosa, modorrenta e cheirosa.
Deixou-se estar.
Que.
Soube, contudo, que havia sol lá fora, que fazia calor, que a temperatura subira. Ecdise? O esqueleto externo já fôra desmontado, por isso estava tão minhoquenta. Só se essa terra for casulo!
Pressentiu uma grande revolução, portanto.

Nenhum comentário: