domingo, 24 de junho de 2007

Esse tal de desejo obscuro. Freud explica? Complica?

E aí mais um filme. Nórdico. “Além do Desejo”, da dinamarquesa Pernille Fischer Christensen. Recém-separada, a durona Charlotte – dona de um salão de beleza – muda-se para o apartamento de cima ao de Veronica, jovem transexual sensível e deprimida. Aos poucos, as duas estabelecem uma relação que vai da cumplicidade ao encantamento, enquanto tentam lidar com os receios e os desejos advindos disso. A grande questão aqui é que a atração e o carinho dependem menos da opção sexual de cada uma delas e muito mais da “sintonia de almas”. O longa é narrado em atos, cada qual com uma espécie de introdução, o que dá uma dimensão épica à (re)descoberta da sexualidade pelas duas personagens.

Uma outra faceta do desejo – o que pulsa em cada uma dessas figuras? O feminino de ambas, o masculino de ambas, o sinal trocado? Como surge a cumplicidade e de que lugarzinho recôndito e miúdo e talvez úmido e um tanto quente e quem sabe vermelho com tons arroxeados ou rosados sai essa tal cumplicidade? Que vira, será, desejo? Desejo de quê, exatamente? Desejo para quê, exatamente?

Bem interessante.
Recomendável.
E, seguindo nessa leva de desejos nórdicos, uma co-produção sueco-dinamarquesa, que une questões de “Infiel” (leia abaixo, no outro post) e de “Além do Desejo”: trata-se do novo longa da Susanne Bier, “Depois do Casamento”. Para manter o programa humanitário que desenvolve numa região pobre da Índia, Jacob precisa voltar à Dinamarca para encontrar um rico empresário que pretende lhe fazer uma polpuda doação. Mas o que seria apenas um encontro de negócios provoca uma virada na vida de ambos. Porque... conto ou não conto? (Você pode parar por aqui. Vou pular uma linha, assista ao filme e volte depois. Ou então, abra mão da surpresa, mas me prometa ver o longa até o fim!)

Jacob teve um affair com a mulher desse rico empresário. Desse relacionamento, uma criança, uma moça. A moça se casa – e, depois do casamento, descobre quem é seu pai verdadeiro. Jacob também não sabia que tinha uma filha. Ele, na verdade, se sentia pai de Pramod, garotinho indiano a quem ele prometeu voltar tão logo fosse possível. Mas Jacob também faz promessas na Dinamarca. E?

A interpretação de Mads Mikkelsen, que fez o vilão do pôquer no último 007, é impressionante. Aliás, assunto puxa assunto, aquela cena do Daniel Craig peladão sendo torturado... u-uh!

A pergunta permanece: há como explicar o desejo? No sentido mais puro da palavra e do sentimento e da sensação e do então?


De “Menina a Caminho”, livro de Raduan Nassar, conto “O Ventre Seco”:
“Você me levava a supor que o amor nos nossos dias, a exemplo do bom senso em outros tempos, é a coisa mais bem dividida deste mundo. Aliás, só mesmo uma perfeita distribuição de afeto poderia explicar o arroubo corriqueiro a que todos se entregam com a simples menção deste sentimento. Um tanto constrangido por turvar a transparência dessa água,há muito que queria te dizer: vá que seja inquestionável, mas tenho todas as medidas cheias dos teus frívolos elogios do amor.” (p. 64)

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