sexta-feira, 22 de junho de 2007

Divagações de uma sonhadora. A ressaca dos mares.

Breves reflexões compactas depois de mais um dia de filmagens e figuração (na verdade, minha participação foi uma ponta – uma ponta anônima de uma atriz em fase de crescimento. Mas eu me diverti e vi, sob um outro ângulo, como nascem os filmes, além de me descobrir com maquiagem. Como nasce LóriCapitu-para-adultos: uau!).

*
EXCESSO DE PROVAS? QUE SE DANEM.

Na manhã de quarta-feira, saindo de um consultório, ouvi quase sem querer a música “Quase sem Querer”, do Legião Urbana, hino que marcou minha adolescência e seguiu fazendo sentido durante a década de 20 e, agora, ao escutá-la novamente e assim tão inesperadamente, aos 30 e, me trouxe um sorriso ao rosto pela constatação de perenidade. Perenidade de pertinência da canção, perenidade de sua reverberação em mim, perenidade de certas questões que vão e vêm com constância, com uma constância cíclica, eu diria, a cada início ou recomeço. Quando o que eu mais queria era provar pra todo mundo que eu não precisava provar nada pra ninguém. Não quero mais saber dessas provas, mas ainda há um desejo difuso e confuso e disperso e reverso de provar que eu não preciso provar nada. Aos poucos, me desvencilho. Daí, procurei na pilha bagunçada de CDs o “Dois” e redescobri “Índios”: “quem me dera, ao menos uma vez, como a mais bela tribo, dos mais belos índios, não ser atacado por ser inocente.” (Acabei de me lembrar de um documentário belíssimo, plástico e poético, pungente e doce, cinema de verdade: “500 Almas”, do Joel Pizzini. Deve estrear em breve. Recomendadíssimo a todos os que concordam comigo e com o Renato Russo: quem me dera não ser atacado por ser inocente.)

*

TEMPO-TEMPESTADE-IDADE-TEMPERATURA-DURA

“Todos os dias quando acordo, não tenho mais o tenho mais o tempo que passou. Mas tenho muito tempo: temos todo o tempo do mundo. (...) Temos nosso próprio tempo.” (RR, no “Dois”, ainda sessão revival)

Essa reflexão eu já tinha dividido com amigos mais chegados:
>>>Nos primórdios dos tempos, no tempo fabuloso dos começos, uma Lóri-Capitu-em-formação assistiu, impávida e muito atenta, ao jogo entre Chronos e Kairós. E, naquele momento, ao estrear no mundo das engrenagens, fez a opção por torcer por Chronos. Comprou camiseta, bandeira, corneta. Torceu, torceu. Até que a paixão por Chronos esfriou, e já não fazia mais sentido manter-se devotada a ele daquele modo. Foi quando ela redescobriu Kairós. A redescoberta foi tão arrebatadora que ela também comprou camiseta, bandeira, corneta, sem medo de ser chamada de vira-casaca. Lóri-Capitu-de-agora sabe que, um dia, vai apreciar esse jogo sem ver nele uma competição; nesse dia, gostará tanto de Chronos quanto de Kairós e vice-versa. Mas, por enquanto, ela não hesita em grudar um pôster de Kairós na parede e suspirar por ele. Kairós oleleô, Kairós oleleá. Por conta disso, constatações muito interessantes apareceram.
Por que correr tanto? Por que me apressar, ultrapassar o tempo das coisas? Planos feitos na era Chronos precisaram ser adaptados à fase Kairós. Sem contar as curvas da vida, é claro. Ei, psiu. E as epifanias, brotando aos montes. Alô, olha aqui. No tempo fabuloso dos recomeços, agora. <<<


P.S.: Me lembrei daquele poema “Instantes”, atribuído erroneamente ao Borges, que se tornou um hit (até eu, na inocência de meu início de inserção no sistema capitalista-produtivo-engrenal, o achava simpático). Hoje, discordo completamente dele. Se eu pudesse viver minha vida novamente, seria mais feliz? Andaria descalça? Tomaria mais chuva? Comeria mais brigadeiro na panela? Me entregaria mais ao amor? Arriscaria mais? Seria menos bem comportada? Não perderia oportunidades? Escreveria um livro, pintaria um quadro, tomaria gelatto na Piazza Navona? Pegaria o primeiro avião com destino à felicidade? Ora, bolas. E por que não começar a fazer isso já? Por que esperar até a decrepitude para lamentar-se do excesso de “nãos” dados ao longo da vida? Tsc, tsc, na minha opinião, mais uma postura equivocada das pessoas-defendidas.


*

À DERIVA. MAS HÁ SEMPRE UM PORTO À SUA ESPERA, MESMO QUE POR MOMENTOS.

Trecho de “Até o Dia em Que o Cão Morreu”, de Daniel Galera (em outro momento, comento o filme que o Beto Brant e o Renato Ciasca fizeram inspirados nele):

“No entanto, ela me encarava sorrindo, com os mesmos olhos que eu encontrava antes nas manhãs, um olhar que nos conectava e expressava que éramos parte um do outro. É difícil imaginar sensação de maior conforto e serenidade do que esta, que surge da ilusão elaborada de que fazemos parte da vida de uma pessoa a ponto de estarmos verdadeiramente unidos, de tudo estar bem se o outro estiver por perto, se apenas nos for dada a chance de saciar os desejos e interesses um do outro, de tolerar um ao outro quando sacrifícios forem necessários e deixar que todo o resto se foda, se destrua e morra, porque não haverá problema. Aquele olhar dela era uma manifestação perfeita dessa ilusão confortadora. Durava pouco, apenas instantes, como qualquer êxtase, mas era eficaz.” (p.81)

“Mas desisti de pensar nessas coisas, apaguei as luzes do apartamento e me deitei do lado dela. No momento, eu tinha alguém pra proteger, e isso era novo.” (p. 45)

Nenhum comentário: